terça-feira, 6 de dezembro de 2011

No silêncio, ela ouve.


O ritual é o mesmo. A chegada, o cumprimento, as conversas, as chamadas à atenção, o frio que se entranha na casa e se aloja em si. As respostas são curtas, vagas, distantes. Não se atreve a olhar ninguém nos olhos. 
Perderam-se. 
Perdera-se deles. Os gestos são automatizados assim como os comportamentos. Por fim, depois de cumprida a sua obrigação, atravessa a porta que ainda a protege do mundo lá fora, e do seu mundo, cá dentro. Entra e fecha a porta atrás de si.
Olha em volta, reconhece tudo o que vê. Identifica tudo como seu, como parte de si. Mesmo sem vontade de sorrir, sente-se confortada e pode agora retirar a armadura, as máscaras, a espada. Fica mais leve. Olha a secretária, perto de si, atira o casaco para cima da cama, arrasta a cadeira, pesadamente e senta-se. Observa o silêncio, e quebra-o com a música daquele dia, daquela hora. Pousa a cabeça e respira. Está a salvo agora. Pode assim sentir o corpo largar a alma, e deixá-la passear-se pelo quarto. Está tão cheia de nada, tão vazia de tudo.
Os olhos estão pesados, e o único brilho que têm é o de se quererem fechar, para renascerem e enfretarem um novo dia, amanhã.
Joana Almeida