terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Somos diferentes

O segredo está em aceitar que somos diferentes. 
Tu não precisas sentir o que eu sinto. Eu não preciso sentir o que tu sentes. Não carecemos de validar o nosso incansável amor e dedicação, não precisamos compará-lo e medi-lo em ações, respostas imunes, ou até mesmo atos planeados. 
É irónico, eu sei. É o que estás a pensar agora. Eu. E logo eu, com uma prédica destas. Mas sou eu própria. E penso realmente assim. Não pensava. Tens razão. Mas devo-te desde já avisar que os dias vão passando, e não passam por mim impunes. Eu retiro algo deles. Aprendo sempre algo. Uns dias as lições pesam mais na minha vida. Noutros dias não distingo a informação nova que apreendi. Mas hoje, hoje isso não aconteceu. Hoje a minha lição arrebatou-me. Não preciso sofrer mais. Apesar de saber que vou continuar a sofrer (Por ti). Mas pelo menos hoje estive atenta á aula teórica que a vida me deu, gratuitamente. Um dia talvez, eu a coloque em prática. Por agora, vou persistir, sabendo que estou mais rica em sabedoria especulativa, mesmo que ainda não esteja prevenida para não chumbar no exame final.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

A medida certa!



Nunca foi de medidas certas, pelo contrário.
Sempre vagueou entre o afinco e o desapego, entre o cuidado e a consumpção, entre a paixão quente e a displicência.
Nunca, em momento algum, encontrou a comensuração correta.
Sempre variou entre extremos irremediavelmente contrários.
Nunca pretendeu ser assim.
Sempre se ostentou assim.
Nunca obteve o que mais necessitava.
Sempre conquistou o que mais cobiçava.
Nunca admitiu a sua vulnerabilidade.
Sempre progrediu com ela, camuflada.
Nunca carregou o seu amor desde do ínicio. 
Sempre carregou o seu amor até ao fim.
Nunca, infelizmente.
Sempre, irremediavelmente.


Joana Almeida

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Já me tinha esquecido!



Já me tinha esquecido…

Hoje quis escrever, já a minha memória me anda a falhar há muito tempo. Tive medo. Tive medo porque poderia querer escrever e nada me surgir. Tive medo. Podia escrever coisas que não nasceram para serem escritas. Mas ainda assim, escrevi. Deixei que parte do imenso turbilhão de pensamentos que me consomem durante o dia pudessem, de alguma forma, emergir, irremediavelmente desorganizados, ao meu pequeno eu.
É difícil transcrever pensamentos. Muito mais difícil será tentar perceber parte deles. E os meus então… ‘oh irremediável alma, que não pensas como imaginas…’.
Hoje encontrei-me. Numa imensidão de dia que não parece ter fim, rodeada de gente, de caras que me parecem estranhamente familiares, consegui encontrar-me.
E pensei.
Lembrei-me do que já há algum tempo tenho vindo a esquecer…
Tinha-me esquecido.
Tinha-me esquecido do quão fácil é perder-me numa música, num solo de guitarra, numa frase solta, cheia de poder e independência.
Tinha-me esquecido do quão já longe vai o meu passado. O passado bom. Sim, porque o mau acompanha-me todos os dias. Mas hoje, o bom decidiu fazer-me uma visita, e com ele trouxe todas as coisas das quais eu já me tinha esquecido.
Tinha-me esquecido que se não disser isto agora, talvez me vá ficar preso para sempre. Tantos pensamentos que vêm e não vão, começam a ser demasiados.
Tinha-me esquecido que não sou pessoa de guardar pensamentos, pelo menos retê-los. Os que devem ficar sabem o lugar deles.
Pelo menos assim era, desde que me lembro, ou desde que não me tenha esquecido.
Tinha-me esquecido do quão bom é desenhar á meia luz, no chão do meu quarto.
Tinha me esquecido do quão bom é fechar os olhos no escuro a escutar o que tenho a dizer a mim mesma.
Tinha-me esquecido do quão importante é estar acordada quando o resto do mundo já dorme profundamente.



Tinha-me já esquecido de como era ser feliz!
Tinha vindo a lembrar-me de ti!
Joana Almeida

Hoje vim ver o rio!

Hoje vim ver o rio!
Procurar a calma que me abandonou há longos periodos de tempo. Vim procurar uma réstia de ar puro que me tire deste desassossego e não me deixe sufocar. O Sol está a aquecer-me, e por instantes, só cá estamos: eu, ele e o rio. Era este o som que eu procurava há muito tempo. Porque aqui é bom!


Também pensei que vir cá me faria chorar, ou melhor, pensei que vir cá me possibilitaria, finalmente, chorar. Mas, não. Enganei-me. A dor desapareceu. Estou só eu e o rio aqui. Porque aqui é bom!


Ficaria aqui, assim, para sempre. Continuaria assim, anestesiada. Neste sítio não consigo ouvir-te, não consigo ler-te, não consigo sentir-te. Porque aqui é bom!


Não procuro forças para enfrentar o que quer que seja. Procuro, antes, que estas me sejam tiradas, não quero senti-las. Quero ficar exactamente assim.

Porque aqui é bom ou, pelo menos, não é mau!

No silêncio, ela ouve.


O ritual é o mesmo. A chegada, o cumprimento, as conversas, as chamadas à atenção, o frio que se entranha na casa e se aloja em si. As respostas são curtas, vagas, distantes. Não se atreve a olhar ninguém nos olhos. 
Perderam-se. 
Perdera-se deles. Os gestos são automatizados assim como os comportamentos. Por fim, depois de cumprida a sua obrigação, atravessa a porta que ainda a protege do mundo lá fora, e do seu mundo, cá dentro. Entra e fecha a porta atrás de si.
Olha em volta, reconhece tudo o que vê. Identifica tudo como seu, como parte de si. Mesmo sem vontade de sorrir, sente-se confortada e pode agora retirar a armadura, as máscaras, a espada. Fica mais leve. Olha a secretária, perto de si, atira o casaco para cima da cama, arrasta a cadeira, pesadamente e senta-se. Observa o silêncio, e quebra-o com a música daquele dia, daquela hora. Pousa a cabeça e respira. Está a salvo agora. Pode assim sentir o corpo largar a alma, e deixá-la passear-se pelo quarto. Está tão cheia de nada, tão vazia de tudo.
Os olhos estão pesados, e o único brilho que têm é o de se quererem fechar, para renascerem e enfretarem um novo dia, amanhã.
Joana Almeida

Felicidade é, mais ou menos...





Happiness, more or less, is just a change in me something in my liberty”

É bom quando nos encontramos, a nós mesmos, sozinhos numa sala outrora cheia de vida e movimento. Sozinhos. Ela está calma. Silenciosa. Parada. Eu olho. Oiço. Nada. Só eu e o relógio, na parede, que não pára. Desvio o olhar para o exterior. Vejo movimento, vida. Mas não escuto nada. O silêncio perdura e entranha-se. Eu sei que do outro lado hà vida. Porque a vejo. Mas não a oiço. Por mais que tente. Imagino-o. Imagino o barulho que eu sei que existe, mas que não consigo sentir. Quero senti-lo. Quero ouvi-lo. Não o alcanço.
Uma porta abre-se. O silêncio é perturbado, o meu silêncio. A porta fecha-se. E com ela o barulho desaparece, fica novamente do lado de fora. E para mim, aqui dentro, ele deixa de existir, de ser real. É-me cedido somente o barulho que ainda consigo imaginar, porque outrora o senti, e as memórias precisam de muito mais tempo para serem apagadas, que o tempo em que tenho vindo a viver, em silêncio.
O relógio segue. Eu páro. Descubro que a porta pode ser aberta novamente, agora por mais tempo. Que há uma passagem para o lado de fora. Para o real. Para o que existe. Ali, daquele lado, não precisarei de imaginar mais. Não precisarei das lembranças para o sentir.
Levanto-me. Caminho. Abro a porta. E saio.

Joana Almeida

Uma questão de memória



Há momentos que nos acontecem e vão acontecendo, que nos reportam para o passado. Eles fazem com que sintamos que estamos a reviver uma determinada ocasião, outra vez. Nesse instante, temos o privilégio de sentir algo que pensamos nunca mais sentir. 
Foi-me assentido um momento assim.
Durante o trabalho, atendi um senhor que tinha já uma idade avançada, era alto, estava magro e tinha um cabelo grisalho. No fim do exame ele tinha que calçar os sapatos e eu senti a dificuldade que este senhor estava a ter para realizar essa tarefa. 
Baixei-me e calcei-lhe as meias, a seguir os sapatos e por fim atei os seus atacadores...
 "Oh menina, obrigada, nunca ninguém me tinha calçado os sapatos"!


(...)
- Joana, Joana!
-Diga Vô...
-Anda cá baixo calçar-me os sapatos, filha! Quero ir ao café agora à tarde...
-Já vou, Vô...
(...)
Os passos eram curtos, os chinelos eram sempre arrastados... Pousava a mão no meu ombro, erguia o pé com alguma dificuldade, eu baixava-me, via-lhe as pernas emagrecidas, os pés sempre frios, escolhia umas meias escuras como ele gostava, calçava-as, colocava-as sempre direitinhas sem nenhuma dobra, para que nao o magoassem.
-Não estão demasiado apertados os atacadores, vô?
-Não, não, estão bem assim. Obrigada, o teu avô está velho.
-De nada, de nada! Sempre ás ordens, está nada velho, está ai para as curvas ainda!
(...)


Insignificante. Uma rotina como tantas outras. Que depois de ser perdida, ganha toda a importância do mundo. 
É então recordada com o maior dos carinhos, a mais profunda das saudades...
Um beijo
 Joana Almeida

Efêmera, dizem ...



25.09.2009
Ela tinha dos sorrisos mais rasgados que eu alguma vez vira. Expressivo e contagiante. Todos os domingos encontrava-a, radiante e cheia de ânimo. Transpirava vida. Os filhos tinham grande parte das suas expressões. E amavam-na com todas as suas energias. Era uma força da natureza, uma mulher com garra e determinação. Encontrava a felicidade em pequeninas coisas da vida. E era feliz.
Um dia, demonstrou-me que na vida, tudo é possível e que nunca devemos deixar nada por dizer. Especialmente quando gostamos de alguém. Aí, não há lugar para a vergonha de expormos os nossos sentimentos.
Comoveu-me. Fez-me pensar. Fez-me arrepender. Fez-me crescer. Foram palavras que guardo com muito cuidado. Transformaram-se em lembranças, memórias.
Hoje, é uma mulher inerte, apaziguada. Que sofre silenciosamente, para não dar a perceber. Da noite para o dia tiraram-lhe o que demais precioso tinha, a força de viver.
Em vez de um olhar ingénuo, o sorriso rasgado e expressivo, encontro um olhar longínquo e desocupado. Uma desmedida tristeza invadiu-a, e o cansaço tomou conta do seu corpo.
A alma, a sua alma, sobre esta, só ela sabe.


Joana Almeida


Existem dias que não deviam acontecer...

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

A cadeira vazia


Uma cadeira deixada vazia pode tornar-se algo muito desconcertante, perturbador, inquietante.. Quando, momentos antes, essa cadeira era ocupada por alguém que, sozinho, conseguia encher o salão que é a nossa cabeça.
A distãncia que nos separa dessa cadeira e, consequentemente, dessa pessoa pode ser enorme, assim como os obstáculos e barreiras podem ser inúmeros. Mesmo assim, se o nosso olhar for certeiro e conseguirmos visualizar essa cadeira ocupada, tudo fica apaziaguado, sentimo-nos inabaláveis, quedos, serenos, e podemos vaguear, confiantes, pela sala partilhando a nossa atenção com outros pequenos e insignificantes estimulos.
É, portanto, fácil estarmos na nossa mesa, rodeados de ruído e pessoas, a contemplar essa cadeira ocupada. Em cada vez que a olhamos sorrimos interiormente e, sem que ninguém note, ou pelo menos assim o achamos, aproveitamos para reparar nos contornos da pessoa que a ocupa. Usufruimos de cada momento para examinar a maneira como os lábios foram desenhados, para observarmos a cor da pele, tão diferente, a cada instante. Admiramos a maneira como ajeita o cabelo, a roupa que escolheu naquele dia, a maneira como se move, o formato das mãos e principalmente gozamos da pulcritude do seu sorriso.
Até aqui, e sem a ilustrarmos, a nossa alma está conciliada, não pensamos nem projectamos o que temos que fazer amanhã ou, até mesmo, lamentamos o que deveriamos ter feito ontem. Observamos e tudo o resto é insignificante.
É então, que o desfecho sobrevem sobre nós e a cadeira é deixada nua e vulnerável. Desviamos a nossa atenção por uns segundos, e quando nos voltamos a focar no que prendeu o nosso olhar a noite toda, não sabemos mais para onde foi. Não sabemos mais onde está.
O olhar fica preso novamente mas, desta vez, a uma cadeira deixada vazia, desconcertante, perturbadora e inquietante. Ficámos presos a uma consciência de solidão, a um lugar por ocupar e a um vento enregelado e paralisante que preenche o salão que é o nosso coração.
Joana Almeida